segunda-feira, 26 de abril de 2010

Homens morrem crianças, mulheres nascem adultas




Texto e ilustração Aggeo Simões


 


Esse aí em cima é o título do livro de autoajuda que eu, infelizmente, nunca vou escrever. Me veio à cabeça quando minha filha começou a dar banho, comidinha e beijos de boa noite em suas bonecas. De vez em quando a Luna, nossa cachorrinha, entra na dança. Se não fosse pela sua índole de monja tibetana, a coitada já tinha fugido há tempos.

Pois é, o que leva as meninas a brincarem tão cedo com sérias e trabalhosas obrigações futuras? Eu sei que hoje é meio démodé ficar evidenciando contrastes entre homens e mulheres, que é legal agora sermos como as ideologias políticas contemporâneas: sutilmente diferentes. Mas na infância essa diferença é gritante. Século XXI, e minha filha brinca de princesa-mamãe. Não nego que haja uma modernidade aí, porque o príncipe nem é mencionado.

Instinto. Como uma leoazinha que brinca de caçar, mulheres exercitam desde crianças a maternidade, tornando as coisas mais fáceis quando efetivamente viram mães. E tem outra. Eu, como pai solteiro, fico sempre impressionado com o sexto sentido materno, esse software nativo feminino que facilita demais a vida de vocês. Já vi uma mãe descolar os olhos de seu livro apenas um segundo antes do filho fazer uma besteira e conseguir alertá-lo, outra que desconfiou de uma babá só de olhar pra ela e depois descobriu que a moça tinha ficha mais suja que fralda usada, e ainda outra que acordou no meio da noite sem motivo, foi ao quarto de seu filho e encontrou-o ardendo em febre. Se vendessem o elixir do sexto sentido em farmácia, acho que eu o compraria mais do que remédio pra nascer cabelo, se existisse também.

Essa falta de especialização não exime o pai de sua presença e responsabilidade, mas torna a tarefa mais trabalhosa pra nós. Enquanto eu e minha filha estivemos na praia, não consegui ler nem vinte páginas de um dos livros que levei, tinha que ficar alerta o tempo todo pra garantir que ela estivesse bem. Não tenho essa autoconfiança natural das mães. Claro que se eu tivesse esse “sexto sentido” bem aguçado também tentaria usá-lo em tarefas menos nobres como aplicar na Bolsa ou jogar na loteria. Mas uma parte da grana que eu ganhasse iria pra conta-poupança da minha pequena, juro.


 


Aggeo Simões é autor do blog Manual do pai solteiro. Seu Twitter é @aggeosimoes.




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